NOTA9.0
Franquia mutante ganha fôlego com nova investida.
Antes de entrarmos no
filme em questão, peço licença para recordar um pouco do legado mutante,
pois, no início da década passada, quando Bryan Singer (Os Suspeitos),
que não era grande apreciador de histórias em quadrinhos, viu no
roteiro da possível adaptação de X-Men, a oportunidade perfeita de
criar, além de uma promissora franquia, a alegoria pontual
correlacionada ao preconceito, não imaginava estar dando início ao
subgênero que iria se tornar o maior filão da indústria cinematográfica
hollywoodiana. X-Men: O Filme(2000) não só gerou continuações, como também filhotes, sendo referencial para várias outras obras do estilo. Seu sucessor, X-Men 2 (2003),
ampliou ainda mais o universo mutante com um leque de temas
impressionantes – sendo eleito, até hoje, uma das melhores transposições
da nona para a sétima arte. Contudo, após o tremendo sucesso dos Filhos
do Átomo, Singer recebeu e aceitou o convite da rival, Warner, para comandar a volta aos cinemas do Homem de Aço. Onde fez Superman: O Retorno (2006), que obteve um público abaixo do esperado e sofreu duras críticas por parte da imprensa.
Por outro lado, a FOX decidiu tocar o barco com um novo comandante, chamou Brett Ratner (A Hora do Rush) para dirigir X-Men – O Confronto Final (2006),
que mesmo sem a qualidade artística dos títulos anteriores, e possuindo
um desfecho nada satisfatório, faturou bem e deu sopro para novas
aventuras. O caso do pavoroso X-Men Origens: Wolverine (2009),
que, mesmo fazendo dinheiro, é tido pelo consenso geral como o pior
filme dos Mutantes. Mais tarde, com os heróis já fixados no cenário
mundial, Singer retorna como produtor, e traz Matthew Vaughn (Kick-Ass: Quebrando Tudo) para dirigir um dos movie heroes mais interessantes já lançados, X-Men: Primeira Classe (2011).
Um trabalho que, além de abordar os temas recorrentes dos anteriores e
mostrar a origem de personagens marcantes, colocou os heróis em meio
alguns fatos históricos, como a Guerra Fria, por exemplo. Reacendendo,
novamente, a chama dos fãs, que foram conferir o recente Wolverine: Imortal (2013), de longe mais eficaz que seu precedente, mas nada especial.
Pois bem, onze anos depois, Bryan Singer está de volta à direção dos X-Men, com Dias de um Futuro Esquecido,
um longa-metragem que chega com a responsabilidade de manter o bom
nível de Primeira Classe, e incrementar novos elementos à franquia. E,
para surpresa geral, o troço não só faz isso, como também conserta
falhas dos anteriores e, praticamente, zera o universo referente. Sim,
Bryan uniu o útil ao agradável, pegou uma clássica história dos
quadrinhos, que mexe com viagens no tempo e alteração de realidade –
arco este que foi o principal referencial de James Cameron, em sua franquia de O Exterminador do Futuro –,
tirou do túmulo figuras conhecidas e trabalhou com dois núcleos,
alternando entre o passado e futuro. Se dando ao luxo de dar pouco tempo
de tela a atores consagrados – o que de forma nenhuma incomoda, já que
todas as escolhas do cineasta parecem ter funções precisas.
Dedicando quase três
quartos do filme ao drama, Singer não surpreende em optar deixar de lado
inúmeras cenas de ação ou vilões caricatos. Em toda sua carreia, o
diretor nunca teve urgência em explorar em demasia esses pontos. Não por
falta de tato, já que quando resolve fazer algumas tomadas de combates,
acerta em cheio, pois, além de engendrar planos elegantes, repleto de
ângulos primorosos, desperta tensão no espectador, que por muito criar
identificação com o personagem, devido ao ótimo desenvolvimento, tem
receio sobre o que este vai sofrer. Se na segunda parte ficamos
boquiabertos com a cena do Noturno invadindo a Casa Branca, aqui nos
deparamos com a investida do jovem mutante Mercúrio, ao entrar no
Pentágono para resgatar Magneto, numa tomada absolutamente empolgante.
Muitos indagavam, com
razão, a problemática dos buracos em meio à franquia, principalmente
depois das divulgações de notícias, em relação ao estado de alguns
personagens, como Charles Xavier estar andando e Hank McCoy voltar a ser
um humano normal. O roteirista Simon Kinbergfoi
tão feliz em escolhas que resolveu esses dois casos num simples e
convincente artifício. Bem como seguiu por caminhos inesperados, focando
em direções súbitas, pegando a plateia desprevenida. A história não tem
grande força ao abordar os temas já vistos anteriormente – ainda que
trate bem a questão do que um gesto impensado pode gerar -, mas transita
na perigosa via do passado-presente-futuro. E por muito empreender
isso, quase não se permite errar, é admirável como o texto está redondo e
amarrado, de modo geral.
Entrando em questões técnicas, é interessante observar a fotografia do ótimo Newton Thomas Sigel (Drive),
que tendo a seu dispor apenas uma regular direção de arte e um adequado
figurino, confere o tom de cada época investida. Com lentes mais
quentes e amareladas na década de setenta, obtendo um resultado
vibrante; e no futuro possui paletas mais frias e escuras, criando um ar
fúnebre e apocalíptico. Os efeitos especiais estão críveis e
impressionantes, novamente não há do que reclamar nesse quesito. Bem
como o visual dos personagens, robôs e cenários, tendo todas as cenas
internas planejadas. John Ottman(Operação Valquíria),
antigo parceiro de Singer, também dar as caras e repete o bom trabalho
feito anteriormente no segundo título, quando marcou a franquia com sua
música tema.
Com um cast de altíssimo
nível, de dar inveja a qualquer produção, o elenco da fita está muito
afiado, isso por já terem trabalhado com Singer. Como era de se
esperar, Hugh Jackman, o
eterno Wolverine, é o protagonista do conto, estando numa de suas
melhores fases como ator e vivendo o auge de sua forma física. James McAvoy (Xavier) passa bem a imagem de alguém que sofreu por anos. Michael Fassbender (Erik) e Jennifer Lawrence (Mística) dispensam maiores comentários, já que, quando em tela, dominam completamente. Ellen Page (Kitty) não compromete e tem pouquíssimas cenas, já Halle Berry (Tempestade) entrega um trabalho nada sutil, repleto de caras e bocas. Peter Dinklage está contido e faz seu Dr. Bolivar Trask parecer crível. Ian McKellen (Magneto) continua com a classe de sempre. Mas quem rouba mesmo a cena por aqui é Evan Peters, que traz Mercúrio, o personagem mais cativante da fita.
Mesmo não tendo a leveza narrativa e o charme estético de Primeira Classe, ou a amplitude de roteiro e variedade de temas visto em X-Men 2, Dias de um Futuro Esquecido é
um filme completamente genuíno, que aborda arcos dramáticos e dar nova
vida a uma franquia que muitos consideravam falecida. A organicidade no
contar de sua história, o desenvolvimento de personagens e as inúmeras
amarrações temporais são mais que suficientes para considerar este um
grande acerto, e que, provavelmente, iniciará uma nova leva de filmes.
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